Diagnóstico
A alergia ao látex é definida como a demonstração de sensibilidade mediada por IgE às proteínas do látex, em associação com sintomas de urticária de contato, angioedema, rinite, conjuntivite, asma ou anafilaxia, ocorrendo quando um indivíduo entra em contato com os alérgenos (HUNT, 1993; BREHLER & KUTTING, 2001). O diagnóstico é baseado no levantamento da história clínica detalhada de sintomas relacionados às reações mediadas por IgE a produtos de látex, bem como no levantamento de certas condições de risco como a presença de atopia, múltiplas cirurgias, história de alergia a frutas, exposição ocupacional, entre outras, e o diagnóstico clínico é confirmado por diagnóstico laboratorial (KURUP & FINK, 2001).
Os testes auxiliares de diagnósticos mais utilizados são: in vivo, como o TCP com solução de antígenos da borracha, pela presença de IgE antilátex na pele, sendo considerado o método mais seguro para o diagnóstico (TURJANMAA et al., 1997; KURUP & FINK, 2001) ou in vitro, como o método enzyme-linked immunoabsorbent assay (ELISA) pela detecção de IgE antilátex no soro (TURJANMAA et al., 1996; WOODS et al., 1997; POLOSUO et al., 1998; KURUP & FINK, 2001). TURJANMAA et al. (1997), em estudo multicêntrico na França e Finlândia, analisaram o extrato comercial de látex de borracha natural para padronizá-lo em TCP em pacientes com diagnóstico de alergia ao látex do tipo I e em pacientes sem alergia ao látex do tipo I, tendo obtido 100% de especificidade e 93% de sensibilidade.
BLANCO et al. (1998), comparando o desempenho de soluções preparadas para TCP de quatro soluções comerciais, quatro soluções-teste de alérgeno de luvas de látex e um extrato de látex natural com teste sorológico para determinar IgE específica, encontraram para a solução-teste de alérgeno de luvas de látex de 64% a 96% de sensibilidade diagnóstica e 100% de especificidade.
HAMILTON, BIAGINI, KRIEG (1999), estudando o desempenho de três imunotestes anticorpo IgE específico ao látex, licenciados pela Food and Drug Administration (FDA), encontraram 76,3% de sensibilidade e 96,7% de especificidade para o teste RAST da empresa Pharmacia-UpJohn Corporation, em comparação ao TCP com solução comercial Greer.
No ambiente de trabalho, a exposição aos antígenos do látex pode ocorrer através do contato direto com a pele ou membranas mucosas, ou pela inalação de partículas de proteínas aderidas ao pó das luvas e dispersadas no ar (REIS, 1994; VANDENPLAS et al., 1995) e a expressão clínica da hipersensibilidade do tipo I ao látex nos indivíduos sensibilizados depende da via de exposição aos antígenos, podendo ser cutânea, mucosa e respiratória.
A absorção das proteínas do látex através da pele é considerada a principal via de sensibilização nos trabalhadores da área da saúde e também a principal responsável pelas manifestações de urticária local, mas eventualmente podem se estender para outras áreas, tornando-se sistêmica (WARSHAW, 1998; KURUP & FINK, 2001).
Tem sido demonstrado que a inalação das proteínas dispersadas no ar e aderidas ao pó das luvas é capaz de desencadear sintomas nasais, oculares e respiratórios (BLANCO et al., 1998), sendo que a inalação por indivíduos sensibilizados pode levar à rinite, conjuntivite e asma, além de manifestações graves de anafilaxia sistêmica, taquicardia, angioedema, náusea, vômito, desconforto abdominal e hipotensão (WOODS et al., 1997; WARSHAW, 1998).
VANDENPLAS, DELWICHE, De JONGHE (1997), descreveram o desenvolvimento de asma ocupacional desencadeada por antígenos do látex e da amoxacilina em uma farmacêutica, tendo a presença de IgE específica ao látex sido diagnosticada por análise sorológica. Estudos adicionais de teste de provocação brônquica específica foram realizados e evidenciaram a manifestação de desenvolvimento de asma ocupacional pelos dois antígenos. Por sua vez, VENTURA et al. (1999), descreveram reação de hipersensibilidade do tipo I para o látex e amoxacilina em uma enfermeira de centro cirúrgico, cuja hipersensibilidade foi identificada através da análise sorológica, sugerindo também ser uma doença ocupacional.
O pó presente nas luvas desempenha papel importante nas reações de hipersensibilidade do tipo I específica ao látex, pois além de ser responsável pelas reações respiratórias devido à exposição aos alérgenos dispersados no ar, é também responsável pelas reações dérmicas devido à exposição cutânea (LISS, et al.; 1997; BREHLER & KUTTING, 2001).
É descrito que a quebra da integridade da pele pode facilitar a sensibilização ao látex por absorver os antígenos através das lesões (LISS et al.; 1997). O rompimento da integridade da pele provocada pelas lesões pode também propiciar a entrada de patógenos ou outros agentes nocivos, que podem causar risco à saúde dos trabalhadores. Medidas para se reduzir estas queixas e melhorar as condições da pele das mãos dos trabalhadores da saúde envolvem particularmente o uso de luvas de látex sem pó, disponibilizar sabões anti-sépticos para lavagem das mãos, com características de pH compatível com a pele e com presença de umectantes, intercalar com solução anti-séptica alcoólica a 70% cada lavagem das mãos (LARSON, 1995; LARSON, 2001) e melhorar a qualidade do papel-toalha utilizado para secar as mãos após a sua lavagem.
Em estudo conduzido por TRAPÉ, SCHENCK, WARREN (2000), para avaliar os sintomas de trabalhadores da saúde um ano após ser implantada política de restrição ao uso de luvas com pó, encontraram 40,3% de sintomas de dermatite, 10,6% de sintomas respiratórios e 3,6% de urticária.
Reação cruzada com alimentos
A alergia a múltiplos alimentos, principalmente frutas e castanhas, está, também, associada à alergia a produtos de látex de borracha natural e têm-se demonstrado que pacientes com alergia ao látex do tipo I freqüentemente sofrem de intolerância alimentar, apresentando sintomas orofaringeais e às vezes anafilaxia.
Alérgenos comuns ao látex e frutas têm sido identificados, incluindo banana, abacate, papaia, melão, manga, abacaxi e pêssego, entre outros (BREHLER et al., 1997). Esta reatividade cruzada com alérgenos de outras plantas é explicada pela presença de epitopos de IgE comuns entre látex e frutas (KURUP & FINK, 2001).
BREHLER et al. (1997), relataram a associação de alergia do tipo I ao látex com papaia, abacate, abacaxi, banana e castanha, entre outras frutas. Dos 136 participantes com hipersensibilidade do tipo I ao látex, 51% tinham IgE específica ao papaia, 46% ao abacate, 36% à castanha e 19% ao abacaxi. Outros estudos encontraram evidência de forte associação entre a ingestão de alimentos como castanha, banana, kiwi, melão, pêssego e abacaxi indivíduos com sorologia positiva para o látex (LAGIER et al.; 1992, LISS et al.; 1997, GARCIA ORTIZ et al.; 1998, LOPES, BENATTI, ZOLLNER, 2004).